segunda-feira, 29 de abril de 2013

«Partiu-se»



Isabela ia na Rua, apressada. Distraída. Numa mão o saco com os livros que acabara de comprar na Livraria do Bairro. No braço oposto um casaco dependurado. Estugava o passo para contrariar o atraso. Tropeçou e caiu desamparada. Esfolou os joelhos com gravidade. Sangrava. As mãos também ficaram em mau estado. Os livros espalharam-se à sua volta. O casaco, então imundo, jazia na calçada. Não era a desordem exterior que a perturbava. O problema é que, ao cair, qualquer coisa dentro de si se quebrara. Sararam as mãos. Os joelhos. As articulações recompuseram-se. Aconteceu que nem tudo tivesse conserto. Desde aquela hora havia uma dor indefinível a comê-la por dentro. Lembrava-se de ouvir aos mais velhos, quando miúda: "Não morres da doença, há-de ser da cura." Habituou-se ao facto de que há coisas incuráveis e inoperáveis. Estão em locais inacessíveis ao bisturi. Resignou-se a viver com a mazela. Nunca mais usou saltos altos e caminha muito devagar, como quem não...

Andreia Azevedo Moreira

Criado em Junho de 2009. Saiu pela primeira vez à Rua em 29 de Abril de 2013.

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